Compra de imóvel: saiba como proceder em caso de distrato

15/03/2016. Enviado por em Consumidor

O distrato/rescisão de compra de imóvel novo tem sido, financeiramente, bastante benéfico ao comprador. Os Tribunais, em regra, têm mandado devolver cerca de 90% dos valores pagos, corrigidos desde a data de pagamento das parcelas + juros e a vista

O distrato/rescisão da compra do imóvel novo é perfeitamente possível e tem sido muito favorável em termos econômicos ao comprador. Uma palavra muito utilizada ultimamente entre os compradores de imóveis é distrato.
 
Um levantamento recente da agência de classificação de risco Fitch, mostra que de cada 100 imóveis vendidos em 2015, 41 foram devolvidos.
 
Motivos para distrato de contrato
 
Há diversos motivos pelos quais os compradores têm pretendido fazer um distrato/rescisão da compra do imóvel. Dentre eles, a situação econômica por que passa o Brasil. A incerteza quanto à manutenção de seus empregos, perda de interesse, por a construtora vender a mesma unidade por preço igual ou menor de quando foi feita a compra, a restrição ao crédito, os bancos estão exigindo muito para conceder financiamento. 
 
Quando o comprador do imóvel consegue enfim o financiamento, percebe que aquela simulação feita pelo corretor de imóveis não condiz com a realidade, ou seja, a entrada e as parcelas do financiamento se tornaram muito altas.
 
Para aqueles que adquiriram um imóvel pensando em investir, tiveram uma grande decepção. A agência de classificação Moody’s prevê que a queda atual dos preços dos imóveis seja ainda maior, de 15% a 20%. Pois os preços anunciados não refletem os preços dos negócios fechados.
 
Passam-se os anos e é inevitável dizer que a maioria das pessoas tem o sonho da casa própria ou até mesmo uma aquisição como investimento. Para baratear os custos com a conquista imobiliária, uma parte da população opta pela aquisição do seu imóvel na planta. Porém, infelizmente, nem sempre as coisas correm como o comprador planejou. Assim, a desistência da compra pode acontecer por diversos motivos além dos já citados.
 
Diferente do discurso usado pelas incorporadoras quando se comunica a necessidade de distrato ou rescisão do contrato, é garantida por lei a devolução do dinheiro.
 
As construtoras costumam inserir em seus contratos que em caso de distrato/rescisão, será devolvido cerca de 30%, não será corrigido e a devolução não é a vista e sim em tantas parcelas quantas foram pagas pelo comprador.
 
Não é isso que o Judiciário entende e tem decidido. O Judiciário tem entendido que a construtora tem o direito de reter cerca de 10% do valor já pago e é obrigada a restituir cerca de 90% do que o comprador já pagou, com correção monetária retroativa, juros e a vista, sem que o cliente precise justificar os motivos que o fizeram desistir da compra.
 
Distrato ou rescisão por culpa da incorporadora
 
Se a obra estiver atrasada, por exemplo, o cliente tem o direito de receber todo o valor já investido (100%), com valor corrigido e multa de 1% ao mês.
 
E caso o cliente esteja inadimplente, mesmo assim, deve receber os 90% do valor investido, com correção monetária desde cada um dos pagamentos. O comprador pode requerer, também, indenização por perdas e danos, já que a desistência não estava planejada por ele e, assim, foi forçada a acontecer.
 
Distrato x Rescisão
 
Tanto o distrato como a rescisão funcionam para a desistência da compra. Porém, para que o distrato aconteça é necessário um acordo de ambas as partes. Assim, ocorre a extinção da relação contratual, porém regidos por padrões já estabelecidos e citados acima. Ele funciona como um novo contrato, no qual se confirma o fim dessa relação antes definida.
 
Porém, devido as práticas abusivas e cláusulas nulas dispostas no contrato de compra e venda, o caminho tem sido recorrer ao Judiciário.
 
O cliente não precisa justificar os motivos que o levaram à desistência da compra. Por mais que a incorporadora exija essa resposta, é direito do cliente o sigilo independentemente do que conste em contrato assinado. A Lei Federal 8.078/90, determina a nulidade de cláusulas inseridas em contrato e que são abusivas.
 
Lei Federal 8.078/90
 
Art. 39. É vedado ao fornecedor de produtos ou serviços, dentre outras práticas abusivas:
V - exigir do consumidor vantagem manifestamente excessiva;
 
Art. 51. São nulas de pleno direito, entre outras, as cláusulas contratuais relativas ao fornecimento de produtos e serviços que:
IV - estabeleçam obrigações consideradas iníquas, abusivas, que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada, ou sejam incompatíveis com a boa-fé ou a eqüidade;
 
O direito ao distrato/rescisão/devolução do contrato de compra de imóvel adquirido novo, está tão consolidado no Judiciário do país, que o Superior Tribunal de Justiça inclusive editou uma Súmula (concretização de entendimento reiterado sobre um assunto)
 
Súmula do Superior Tribunal de Justiça
 
Súmula nº 543: “Na hipótese de resolução de contrato de promessa de compra e venda de imóvel submetido ao Código de Defesa do Consumidor, deve ocorrer a imediata restituição das parcelas pagas pelo promitente comprador – integralmente, em caso de culpa exclusiva do promitente vendedor/construtor, ou parcialmente, caso tenha sido o comprador quem deu causa ao desfazimento.”
 
O Tribunal de Justiça de São Paulo também já emitiu Súmulas (concretização de entendimento sobre determinado assunto):
 
· Súmula n° 01: O Compromissário comprador de imóvel, mesmo inadimplente, pode pedir a rescisão do contrato e reaver as quantias pagas, admitida a compensação com gastos próprios de administração e propaganda feitos pelo compromissário vendedor, assim como com o valor que se arbitrar pelo tempo de ocupação do bem.
· Súmula n° 02: A devolução das quantias pagas em contrato de compromisso de compra e venda de imóvel deve ser feita de uma só vez, não se sujeitando à forma de parcelamento prevista para a aquisição.
· Súmula n°03: Reconhecido que o compromissário comprador tem direito à devolução das parcelas pagas por conta do preço, as partes deverão ser repostas ao estado anterior, independentemente de reconvenção.
 
O mesmo Tribunal, como outros espalhados pelo país, tem determinado em caso de distrato de imóvel a devolução de 90% do que o comprador pagou.
 
Ementa (resumo de Decisão judicial)
 
COMPROMISSO DE VENDA E COMPRA. Sentença que julgou procedente em parte ação de rescisão contratual cumulada com pedido de devolução de quantias. Hipótese de desistência do negócio. Possibilidade de retorno à situação anterior. Necessária devolução de 90% dos valores com correção monetária desde os desembolsos e juros da citação. Retenção maior causaria enriquecimento ilícito da vendedora. Cobrança de taxas de assessoria é considerada ilegal e devem ser devolvidas. Mantida a sucumbência. Recurso desprovido. (TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SÃO PAULO – Apel. 4003067-85.2013.8.26.0506 – Relator Teixeira Leite – 30/04/2015)
 
Ementa (resumo de Decisão judicial)
 
Apelação. Cobrança. Resolução de compromisso de Compra e venda, após 5 meses da aquisição. Devolução de parcelas. Abusividade de cláusula constante do distrato.Determinação de retenção de apenas 10%. Imóvel que sequer chegou a ser entregue aos apelantes. Recurso provido. (TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SÃO PAULO – Apel. 0004818-12.2010.8.26.0562 – Relator Mauro Conti Machado – 25/06/2015)
  
No Superior Tribunal de Justiça também já há Decisões no sentido de a construtora ter de devolver, em sede de distrato/rescisão de compra de imóvel, 90% dos valores pagos com retenção de 10% pela construtora.
 
Ementa (resumo de Decisão judicial)
 
CIVIL E CONSUMIDOR. COMPRA E VENDA DE IMÓVEL. DISTRATO.REVISÃO DE CLÁUSULAS. POSSIBILIDADE. DISTRATO DE COMPRA DE IMÓVEIS. PRELIMINAR DE AUSÊNCIA DE INTERESSE RECURSAL REJEITADA. CLÁUSULA PENAL COMPENSATÓRIA. REDUÇÃO. ART. 51, CDC e 413, CC. DEVOLUÇÃO DE IMÓVEL. PREVISÃO CONTRATUAL EXPRESSA.
 
Recurso parcialmente provido
 
(...) A incorporadora tem direito a reter parte do que foi pago a título de pena compensatória no caso de rescisão contratual. No entanto, o importe previsto se mostra excessivo e coloca o consumidor em patente desvantagem, pois perde parcela significativa do que foi efetivamente pago, o que afronta o disposto no art. 51 do CDC, sendo cabível sua redução para 10% sobre o valor efetivamente pago pela compradora, nos termos do art. 413 do CC. 2.1. Precedente do Superior Tribunal de Justiça: II - A jurisprudência da Quarta Turma tem considerado razoável, em princípio, a retenção pelo promitente vendedor de 10% do total das parcelas quitadas pelo comprador, levando-se em conta que o vendedor fica com a propriedade do imóvel, podendo renegociá-lo. ”
 
(Superior Tribunal de Justiça - REsp 85936/SP, Rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, Quarta Turma, DJ 21/09/1998, p. 166).
 
A rescisão contratual remete os contratantes à situação jurídica anterior, disponibilizando o imóvel à Incorporadora para nova negociação, não havendo se falar em prejuízos ou cobertura de gastos administrativos a serem suportados pelo consumidor. Recurso parcialmente provido. (fl. 197-198). (SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA – Agrav. Em REsp. 718.597 – Relator Ministro Luis Felipe Salomão - 11/06/2015)
 
Rescisão pós-utilização
 
É importante lembrar que quando o comprador recebe as chaves do imóvel, caracteriza-se posse. Dessa maneira, não se pode mais pedir o distrato. Um contrato que se opõe ao contrato inicial, não seria possível neste caso, como é o caso dessa opção. 
 
Conclusão
 
Sendo assim, caso você, comprador, escolha pela rescisão do contrato (distrato/devolução da unidade imobiliária) perante a construtora ou até mesmo a incorporadora, não deverá aceitar o valor oferecido, caso a proposta seja inferior a 90% (noventa por cento), das quantias efetivamente pagas contratualmente. 
 
Pois, caso assine um distrato/rescisão da compra do imóvel com a construtora, com um valor menor que 90% das parcelas pagas, pode haver o risco do Judiciário entender que você, comprador, aceitou as condições de distrato propostas pela construtora, mesmo sendo abusivas.
 
Dr. Carlos Rodrigues - Advogado, Sócio Proprietário no escritório Rodrigues Advocacia. Formado em direito no ano de 1998, atua há mais de 15 anos como Advogado, Pós-Graduado em Direito do Consumidor e Direito Imobiliário. Palestrante, Professor e Escritor. - Rodrigues Advocacia e Consultoria. Especializados em Direito Imobiliário.

Assuntos: Compra de imóvel, Contrato de compra e venda de imóvel, Desistência de compra, Direito Civil, Direito do consumidor, Direito imobiliário, Direito processual civil


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