A lei 13.058/2014 torna obrigatória a aplicação da Guarda Compartilhada nos casos em que os pais discordem quanto à guarda dos filhos. A guarda unilateral somente será aplicada caso um dos genitores declare não desejá-la.
Lei 13.058/20014, bem vinda sua linda!
Historicamente e quase como um dogma, no Brasil a guarda e cuidado dos filhos é atribuída à mãe. É a regra do que quem pariu que embale, franqueada outrora pela própria lei, e chancelada ao longo dos anos pela absoluta incompetência dos homens em desempenhar funções básicas da rotina casa-filhos-filhos-casa. Talvez por isso, cerca de 90% das guardas no Brasil sejam unilaterais (aquela em que apenas um dos genitores tem a guarda física dos filhos), e pertençam às mães.
Com o passar dos anos e a crescente libertação dos homens dos grilhões do preconceito que ditava a regra de que cuidar da casa e de filhos é tarefa de mulher, muitos pais passaram a reivindicar na justiça o direito de estar e cuidar de seus filhos.
Como consequência, algumas modificações legislativas foram feitas com o objetivo de facilitar o acesso a esse direito, que é antes, um direito fundamental dos filhos de terem uma convivência familiar saudável. (Constituição Federal, artigo 227). Frisa-se. Convivência familiar saudável. Não estamos falando de convivência saudável com a mãe ou com o pai!
Assim, em 13 de junho de 2008, foi sancionada a lei 11.698 que alterou o texto dos artigos 1.583 e 1.584 do Código Civil, introduzindo a guarda compartilhada na legislação brasileira. No entanto, tal se deu de modo pouco efetivo, pois a referida lei apenas sugeria a aplicação da guarda compartilhada, sem a impor, o que transformou a nobre lei em letra morta.
Finalmente em 23 de dezembro de 2014, depois de multa luta entrou em vigor a lei 13.058, que promoveu nova alteração no texto dos artigos 1.583, 1.584 e nos artigos 1.585 e 1.634 do código Civil estabelecendo o significado da expressão “guarda compartilhada” e trazendo novas disposições acerca da sua aplicação.
Mais significativamente a nova lei tornou obrigatória a aplicação da Guarda Compartilhada nos casos em que se verifique divergência dos pais acerca da guarda e cuidados devidos aos filhos.
Agora a guarda unilateral somente poderá ser aplicada caso um dos genitores expressamente declare não deseja-la.
Essa imposição veio em boa hora, pois finalmente viabiliza a comunicação entre a lei guarda compartilhada e a lei de Alienação Parental (lei 12.318/2010), tornando-as complementares, o que significa dar efetividade à aplicação de uma e outra, o que não ocorria até então, já que a antiga redação da lei de guarda compartilhada (2008) apenas sugerir a sua aplicação, do que decorria a subutilização dessa modalidade de guarda.
E esse é apenas um dos benefícios da nova lei.
Deixando de priorizar a guarda unilateral a nova lei garante maior participação de pai e mãe no crescimento e desenvolvimento dos filhos, o que favorece o desenvolvimento de crianças e adolescentes com menos traumas; propicia a continuidade da relação desses filhos com seus pais e, principalmente, retira da guarda a ideia de posse, de que o filho é propriedade exclusiva de um ou de outro, acaba-se com o famigerado discurso do “a guarda é minha”, que no mais das vezes significa: Eu tenho a posse, eu mando, eu tenho mais poder que você, etc., etc..
Equívocos mais comuns.
A verdade é que há muita opinião equivocada sobre a nova lei da guarda compartilhada. Entre elas a questão da obrigatoriedade de pagar pensão.
Contrariamente ao que muitos acreditam a atribuição de guarda compartilhada não retira do genitor, a obrigação contribuir para o sustento dos filhos.
Os alimentos podem sim ser fixados. Evidentemente, a depender de cada caso e depois de analisada a forma como a família se organizará, as necessidades dos filhos e a situação financeira de cada um dos genitores.
Outro equivoco está relacionado ao período de convivência e local de residência da criança.
A lei sugere a fixação de um período de convivência equilibrado, não necessariamente divido igualitariamente.
A esse respeito, destaca-se que apesar de não haver imposição de uma divisão igualitária, há que se concordar que não há harmonia, tampouco se pode falar em equilíbrio em um sistema de convivência onde um genitor passa sábado e domingo quinzenalmente com o filho, enquanto o outro passa semanas inteiras. São 4 dias para um genitor e 26 dias para o outro.
No processo que vai regular ou modificar o modelo de guarda, essa delimitação temporal se dará com acordo com o arranjo familiar de cada caso e vai depender da disponibilidade de tempo de cada um dos genitores, se eles residem na mesma cidade ou em cidades diferentes, das reais necessidades do menor, da situação econômico-financeira dos pais, etc..
Esses “detalhes” deverão ser observados pelo Juiz quando da fixação do tempo de convivência. Caso isso não ocorra ou, seja feito de modo que se mantenha o modelo 4x26, quando existam condições para uma divisão diferente, caberá ao genitor interessado, através de seus advogados “brigar” para que esses limites sejam fixados da forma mais elastecida possível, sob pena de não atingirmos o fim último a que a lei se propõe, que é dar efetividade à participação de pai e mãe no processo de desenvolvimento dos filhos, levando a uma pluralização das responsabilidades, e ao estabelecimento de verdadeira democratização de sentimentos.
Quanto à residência, o que a lei estabelece que ela será fixada no lugar em que melhor forem atendidas as necessidades dos filhos (1.583, §3º), o que indica que deverá sim ser estabelecida, especialmente nos casos em que os pais residam em cidades diferentes, caso em que será mais difícil fazer uma divisão diária ou semanal do tempo e tarefas entre ambos.
Na prática, a Guarda Compartilha não é mais do que um resgate do conceito de poder familiar, que por sua vez são direitos e obrigações relacionadas aos filhos menores, que exercidos em igualdade de condições, dá a ambos os pais igualdade de direitos, deveres e poderes em relação aos filhos.
O que pode o Juiz no processo de guarda compartilhada.
Para alcançar o que a lei objetiva, o juiz analisando caso a caso e verificando a existência de condições favoráveis poderá aplicar a guarda compartilhada, dividindo atribuições e tempo com pai e mãe, e ainda, caso necessário poderá determinar o encaminhamento deles para acompanhamento psicológico ou psiquiátrico (ECA 129 III).
Ainda. Caso um dos genitores não aceite a guarda compartilhada, ou ambos discordem de sua aplicação, mas ela se mostre viável, e ambos possuam condições de ter o filho em sua companhia, o Juiz poderá aplicá-la, livremente, a requerimento de uma das partes ou do Ministério Público, sem prejuízo da possibilidade de igualmente determinar o encaminhamento dos pais para acompanhamento psicológico/psiquiátrico para que possam bem desempenhar o encargo.
Em casos extremos, mantendo-se o clima de beligerância, é possível ainda que o Juiz atribua a guarda do menor a terceiros, preferencialmente a algum parente, com quem os filhos mantenham relações e afinidade e afetividade, tudo com o objetivo de estabelecer uma convivência familiar saudável.
Conclusão
É bom lembrar que em se tratando de questões de família, nem tudo são flores, e por isso não se pode perder de vista que não apenas os direitos são iguais, também o são os deveres.
Ambos os genitores carregam o ônus complexo que decorre da paternidade o que os sujeita às sanções previstas no artigo 249 do Estatuto da Criança e do Adolescente (e na lei de alienação parental). Além disso, é cada vez maior o número de demandas nas quais os filhos ingressam com ação na justiça pleiteando a reparação dos danos decorrentes da negligência afetiva de foram vítimas.
De acordo com especialistas em saúde mental o modelo de guarda compartilhada é o que melhor atende aos interesses dos filhos de pais separados, portanto assim considerando, e não esquecendo que a dissolução dos laços conjugais não leva à cisão quanto aos direitos, tampouco quanto aos deveres em relação aos filhos e, que é imprescindível que sejam mantidos os laços de afetividade que reduzem os efeitos da separação, cabe aos pais unir esforços para que a organização do compartilhamento da guarda se dê do modo mais produtivo e proveitoso para os filhos, do que decorrerá menor desgaste e sofrimento, apesar de eventuais ressentimentos e dores envolvidas.
Já disse o notável advogado, Dr. Juan Cruet: Vê-se todos os dias a sociedade reformar a lei; nunca se viu a lei reformar a sociedade. No entanto, eu, cá por mim, sigo tal qual Pollyana, acreditando que forçados a cumprir a lei, um dia seremos reformados por ela.