20/12/2016. Enviado por Dr. Rafael Lança Morozeski em Consumidor
A sociedade de consumo de massa torna o individuo apenas um a mais, e isso influencia na relação jurídica. Há portanto uma crise do contrato, pois se não houve regulação nenhuma não haverá liberdade nem igualdade entre as partes.
Quando um determinado fornecedor consegue produzir em serie, vender em serie, prestar serviços em serie, obviamente ele não se relaciona mais com o indivíduo consumidor, mas com a coletividade. O indivíduo sozinho representa pouco ou até nada. A face do mercado de consumo então compõe-se de empresas e instituições mais fortes e individuos consumidores mais fracos.
Nas relações jurídicas contratuais essa situação estremece a base do contrato. As duas bases ou alicerces dos contratos que mais se destacam são: autonomia da vontade e igualdade entre as parte.
Se essas bases ficam prejudicadas, pode-se criar uma relação de dependência. Todo contratante que contrata um serviço para si, ele o faz, na maioria das vezes, por necessidade de sobrevivência (como, por exemplo, uma relação contratual entre uma pessoa física e uma instituição de fornecimento de água), mas essas empresas não dependem de você individualmente.
Tais características, de desvantagem, de dependência, sã resumidas pelo Código de Defesa do Consumidor como vulnerabilidade (artigo 4, inciso I, CDC).
A doutrina em geral costuma trazer 3 conceitos de vulnerabilidade:
Vulnerabilidade Técnica: Dizer que o consumidor é tecnicamente vulnerável refere-se ao desconhecimento técnico do produto pelo consumidor.
Vulnerabilidade Econômica: A vulnerabilidade econômica é o desequilíbrio de poderes econômicos. Então um consumidor é economicamente vulnerável perante ao fornecedor quando comparado ao fornecer, e isso impacta na dificuldade de negociar, de barganhar, de reclamar, na liberdade de escolha, etc.
Então, existe a partir disso regras para contratos de adesão, ou regras que estabeleçam a forma como o contrato deve ser redigido. Observe, por exemplo, no caso dos Planos de Saúde: Se o estado não reconhecesse a vulnerabilidade do consumidor no plano de saúde, os planos de saúde na redação do contrato iriam determinar escolher de forma restritiva quais as doenças, os limites de cobertura, a forma de tratamento, etc.
Vulnerabilidade Informacional: Está relacionada ao consumidor consciente. A ideia de ser consumidor consciente não necessariamente significa comprar só aquilo que cabe no bolso, mas sim ter a consciência de que se faz parte de todo esse contexto, de que é vulnerável de todas essas formas. Ao criar um pouco de consciência sobre isso ficamos menos vulneraveis de forma informacional.
Todo consumidor é vulnerável, todos que participam de relação de consumo são vulneráveis, no entanto, somente alguns são hipossuficientes. Hipossuficiência significa que o consumidor não é autossuficiente, sozinho ele não consegue fazer nada. Se você se sentir enganado, você é capaz de se defender? Sim, pois há um mínimo de senso critico de que há uma lei que lhe protege, o hipossuficiente não, ele pode ser o analfabeto, uma a criança, um portador de determinada deficiência que o limita, é aquele com baixa situação social, na qual são mais vulneráveis que os consumidores normais.
O CDC se aplica às relações de consumo, mas às vezes ficaremos em dúvida se aplica o CDC ou Codigo Civil, tendo em vista que deverá ser observado se aquele ato praticado é ou não uma relação de consumo. Essa relação está mais ou menos definida entre os artigos 2º e 3º da Lei 8.078/90.
O Art. 2º estabele o conceito de consumidor e o art 3º o conceito de fornecedor de produtos e serviços. Uma relação de consumo é aquela que se percebe um negócio firmado entre consumidor e fornecedor para aquisição de produto ou serviço.
As relações de consumo se dão a partir do uso de produtos e serviços, o que forma a relação é o ato de consumir, e esse ato de consumir pode se demonstrar tanto no ato de adquirir/comprar/contratar como também no ato de aproveitar/utilizar, e essa relação se dará perante todos aqueles que são responsaveis por aqueles produtos chegarem às suas mãos (o fabricante/importador/distribuidor/montador/construtor/comerciante, todos são fornecedores, e, portanto, perante cada um destes, sobre a parte contrária, há relações de consumo), conforme pode-se obversar através do art. 17 do CDC/90:
"Art. 17. Para os efeitos desta Seção, equiparam-se aos consumidores todas as vítimas do evento."
Assim, por exemplo, se o seu pai compra uma televisão e te dá de presente, e em determinado dia ela explode perto de você e te causa danos ao corpo, você pode pleitear tais reparações como consumidor, mesmo não tendo sido aquele que realizou a compra, mas foi o destinatário final. No entanto, sobre a questão de saber se a sua relação de compra e venda se encaixa no CDC/90, deve-se informar se ela é uma relação empresarial (utilizando o Código Civil) ou de consumo (Código de Defesa do Consumidor).
Há ainda uma outra possibildade da existência de uma relação de consumo – além daquelas que envolvem o comprador que tem a intenção de dar de presente (sem a intenção de revender) ou o próprio consumidor que compra para si para uso próprio – que seria o indivíduo que sofre os mesmos danos que outra pessoa sofreria. Por exemplo, o sujeito que nunca andou de avião, mas o avião caiu em sua casa. São os consumidores por equiparação, ou seja, o individuo que não adquiriu o produto como destinatário final, mas tem os mesmos riscos.
No direito do consumidor, além do individuo que sofre o dano, toda a coletividade deve ser equiparada a um consumidor. Essa coletividade, na mesma hora, está suscetivel aos mesmos riscos de danos. Não posso esperar que as pessoas que ainda não sofreram o dano se manifestem para o Estado, para que o representante do poder público, então, exerça a defesa deles. O Procon não espera os consumidores ir reclamar. Como essa coletividade não se manifesta, é o Estado que tem que perceber essa lesão e agir. O pouquíssimo número de pessoas que entram com ação individualmente comparado com a coletividade não vai resolver o problema desta mesma coletividade. A coletividade está em risco de dano e deve ser protegida pelo direito.
Texto original: Quem é o consumidor?! A vulnerabilidade nas relações de consumo e as relações consumeristas!
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