22/02/2012. Enviado por Dr. Joaquim Caetano de Almeida
A lei aprovada no final de 2011considera que, qualquer telefonema ou email, realizado ou atendido por um funcionário, fora do expediente, devem ser tratados como trabalho.
Segundo o art. 6º da Consolidação da Leis do Trabalho (CLT), aprovado em 15 de Dezembro de 2011:
"Não se distingue entre o trabalho realizado no estabelecimento do empregador, o executado no domicílio do empregado e o realizado a distância, desde que estejam caracterizados os pressupostos da relação de emprego.
Parágrafo único: Os meios telemáticos e informatizados de comando, controle e supervisão se equiparam, para fins de subordinação jurídica, aos meios pessoais e diretos de comando, controle e supervisão do trabalho alheio.”
Nesse sentido, acordar para atender celular no meio da noite, checar e responder emails, nos finais de semana, feriado e férias podem ser considerados e remunerados como hora extra.
A lei deve desencadear a necessidade de reformulação, das políticas que tratam do uso de meios eletrônicos, fora do expediente, respeitando a área de atuação de cada profissional.
É possível controlar o uso de aparelhos eletrônicos, utilizados para trabalho, no pós-expediente?
Sim, devido ao desenvolvimento contínuo das tecnologias, máxime da informática e os meios de comunicação digitais (internet e outros) o controle é possível, não apenas no “pós-expediente”, mas em todo o período em que houver o trabalho à distância (teletrabalho, anywhere office, home office etc) que pode muito bem ser realizado dentro do horário comercial, conforme as necessidades de cada empresa.
Como será feita a fiscalização? Pode haver restrição dos serviços disponibilizados pela empresa, como email coorporativo?
Obviamente que cada empresa deve se adequar às suas necessidades, conforme o ramo de sua atividade (indústria, comércio ou prestação de serviços), implantando procedimentos tecnológicos dentro das peculiaridades das atividades de trabalho à distância.
Assim, vejo que o artigo em comento (6º, da CLT) necessita ser regulamentado, por exemplo, por meio de portaria do Ministério do Trabalho, no sentido de detalhar melhor e limitar o âmbito de atuação da empresa em face do seu Poder Diretivo, para evitar abusos deste poder em virtude da privacidade de cada trabalhador ou prestador de serviços, face à fragilidade ou hipossuficiência destes.
Pode parecer estranha esta alegação, mas devido à subordinação jurídica e econômica do trabalhador ou prestador de serviços à distância, agora reconhecida e formalizada, consoante o caso concreto, os desdobramentos nas relações de emprego e de trabalho (gênero) terão outros contornos, imprevisíveis; embora cada caso seja um caso diferente a ser analisado e, se necessário, submetê-lo à Justiça Trabalhista para ser apreciado e julgado.
Quanto às restrições dos serviços disponibilizados em e-mails corporativos, sem dúvidas, as empresas devem se proteger ao máximo com procedimentos eficazes face aos agentes externos e até mesmo quanto aos trabalhadores. O ser humano é vulnerável e pode mudar de comportamento e atitudes diante das dificuldades e propostas irrecusáveis, vale dizer: propostas inescrupulosas.
Destarte, frente a estes eventuais riscos, nestes mercados globalizados, as empresas devem se resguardar quanto às suas estratégias de conquista de mercado e na proteção de suas inovações tecnológicas quanto à fabricação de produtos e procedimentos exclusivos de prestação de serviços, tudo isto merece blindagem.
As empresas ficarão mais vulneráveis a ações trabalhistas?
Aqui é o outro lado da moeda, a privacidade das empresas, com esta modalidade de trabalho (teletrabalho) as empresas ampliam o seu ambiente de trabalho e atuação, havendo um cordão umbilical que a coloca num ambiente mais externo, por meio dos empregados ou prestadores de serviço, reduzindo a imunidade da empresa a fatores externos nocivos, diante de um mercado muito competitivo e voraz.
Desta forma, este novo ambiente de trabalho faz as empresas mais vulneráveis às demandas trabalhistas, mesmo porque a CLT, com tal artigo, se tornou mais protetiva aos trabalhadores ou prestadores de serviços, principalmente aos “pejotizados”, que são verdadeiros empregados dissimulados, porém travestidos de trabalhadores autônomos (falsos microempresários), e muitos já trabalham à distância.
Como tais trabalhadores, em sua maioria, laboram ou prestam serviços submetidos à subordinação econômica e jurídica dissimulada, devem merecer a proteção, por isto foi muito bem o legislador neste sentido, no que aduz ao teor do artigo em comento.
Pode haver uma diferença na reformulação das políticas de cada empresa, em relação a área de atuação e o tempo em que o profissional precisa estar disponível para o trabalho?
Diante de um novo ambiente de trabalho, mais amplo, torna-se necessária a reformulação de políticas de atuação, nas estratégias, nas diretrizes e nos planos de ação das empresas. Isto devido as novas condições de trabalho e conforme as peculiaridades de cada empresa, cada uma dentro de seu ramo de atividades.
Assim, exsurgem novos horizontes às empresas e aos trabalhadores, pois agora a situação mudou, as relações de trabalho estão regulamentadas por lei. O que já era praticado, já há tempos, está agora submetido à legalidade e isto, certamente, incomoda os empresários, mas o legislador foi justo.
Esta mudança abre espaço para os funcionários usarem os meios digitais após o expediente, até que ponto esta questão pode ser favorável para ambas as partes?
O uso das tecnologias digitais, dentro e “após o expediente”, pode ser ou não favorável a ambas as partes. Depende de como o capital (a empresa) e a força de trabalho (os trabalhadores) vão se relacionar.
Gize-se assaz fundamental que os empresários se conscientizem da necessidade da mão-de-obra (força de trabalho) para manter o seu negócio ou empreendimento duradouro e rentável, e os trabalhadores da proficuidade do capital (das empresas) para garantia de emprego e justa remuneração.
Todavia, nada impede que as empresas e trabalhadores façam acordos individuais e até coletivos, via sindicato, com as empresas, no sentido de negociar procedimentos, remunerações, jornadas de trabalho e estratégias nas atividades laborais para que possam concretizar as metas das empresas na obtenção do lucro e a remuneração justa e digna almejada pelos trabalhadores.
Certamente, tudo isto, em havendo confiança, comprometimento e honestidade de propósitos recíprocos, ambas as partes só têm a ganhar. Assim, não seriam os meios de comunicação ou tecnologias digitais que determinarão situações benéficas ou não, mas como os empresários e trabalhadores se comportam perante aos meios digitais colocados à disposição de cada parte.
Como os funcionários poderão comprovar que foi feita hora extra após o expediente?
Em verdade, com o novo artigo consolidado, nada muda quanto à forma e valores na cobrança ou pagamento de horas extras. Como não existe, no teletrabalho, o relógio de ponto, indubitavelmente, as empresas implantarão procedimentos tecnológicos, novos softwares, via internet, não apenas para os trabalhadores registrar as sua horas extras, como também para acompanhar o trabalho realizado e a sua qualidade; o que vale dizer: haver o controle pleno das atividades à distância pelas empresas.
Como serão calculados os valores de horas extras deste tipo? E o adicional noturno?
Como já disse, nada muda quanto às horas extras, no que atine a valores (percentuais) e formas de cobrança, apenas será feito via internet e outros meios. Evidente, que o valor das horas extras são, no mínimo, 50% maior que a hora normal, conforme inciso XVI, art. 7ª, da Constituição Federal.
Nos dias feriados e domingos as horas extras são acrescidas de 100%, o dobro da hora normal. Quanto ao adicional noturno também não há mudanças, o percentual é o mesmo, ou seja, 20% sobre a hora normal ( de 52 mim e 30 segundos, art. 72, § 2º da CLT e Súmula. 214 - TST), o período noturno é das 22:00hs às 05:00hs do outro dia.
Já para o trabalhador rural há diferenças, o percentual é de 25% sobre a hora normal (que é de 60 minutos), sendo o período noturno das 21:00hs às 04:00hs do outro dia.
No que atine ao trabalhador portuário o período noturno é das 19:00hs ás 07:00hs do outro dia, sendo o adicional noturno de 20%, e a hora normal é de 60 minutos (SDI-I nº 60, I - TST), e do advogado empregado o período noturno é aquele trabalhado das 20:00hs às 05:00hs, sendo o adicional é de 25%.
Há uma diferença no cálculo das horas extras para cada empresa?
Não, o valor do percentual das horas extras, no mínimo de 50%, é determinado pela Constituição Federal e CLT (nos domingos e feriados, 100% a mais), como já visto. E também não existem diferenças entre empresas urbanas e empregadores ou empresas rurais.
No entanto, nada impede que sejam feitos Acordos Coletivos (entre empresa e sindicato de trabalhadores) ou Convenções Coletivas (entres sindicatos patronais e de trabalhadores), como é previsto na nossa Carta Política (art. 7º, XXVI) esta possibilidade, em ser pactuada, para pagar horas extras acima dos percentuais previstos na Magna Carta e na CLT. O que não é permitido é a redução de tais percentuais.
Para concluir, em síntese, entendo que esta nova redação no caput do artigo e a inserção do parágrafo único, vieram consolidar a concepção da subordinação estruturada, engendrada pelo justrabalhista e Ministro do TST Maurício Godinho, em face do trabalho precário tão comum nos ambientes de trabalho neste Torrão Tupiniquim! É uma nova doutrina que se consolida no Direito Trabalhista Brasileiro; foi alvissareira a sensibilidade e a oportuna intervenção do legislador.
Dr. Joaquim Caetano de Almeida é advogado em Goiânia/GO