23/08/2013. Enviado por Dr. Alexandre Vieira de Castro
Lei 12.740/12 revogou a lei 7.369/85 (Lei dos eletricitários), um retrocesso histórico que vem desmoronar uma base de conquistas adquiridas com esforços ao longo dos anos, que após uma luta incessante enfrentando opressões da classe patronal, foi concedido ao trabalhador eletricitário o diferencial que lhe é cabível. Para melhor assimilação se faz elementar examinar a evolução da referida lei.
O art. 1º da Lei nº 7.369/85, que regulamenta o adicional de periculosidade para os trabalhadores no setor de energia elétrica, prevê:
"Art. 1º. O empregado que exerce atividade no setor de energia elétrica, em condições de periculosidade, tem direito a uma remuneração adicional de 30% sobre o salário que perceber."
Vale ressaltar que a base de cálculo do adicional de periculosidade para o eletricitário é distinto dos demais trabalhadores, enquanto estes percebem adicional calculados sobre o salário base, aqueles percebem o adicional de periculosidade sobre tudo que receber a titulo de parcelas salariais. Para os trabalhadores em geral, aplica-se como base de cálculo do adicional de periculosidade o § 1º do art. 193 da CLT:
“§ 1º - O trabalho em condições de periculosidade assegura ao empregado um adicional de 30% (trinta por cento) sobre o salário sem os acréscimos resultantes de gratificações, prêmios ou participações nos lucros da empresa. (Incluído pela Lei nº 6.514, de 22.12.1977)” (Grifo Nosso).
Ou seja: enquanto § 1º do art. 193 da CLT prevê que os trabalhadores em geral receberão o adicional de periculosidade “sobre o salário”, a legislação específica aplicável à categoria dos eletricitários refere-se ao "salário que perceber", bem mais benéfica, compensando o elevado risco de morte experimentado pelo eletricitário e profissionais afins.
A Súmula 191 do TST 121 vem elucidar qualquer dúvida acerca do tema, e esclarece a importância de tal distinção:
"O adicional de periculosidade incide apenas sobre o salário básico e não sobre este acrescido de outros adicionais. Em relação aos eletricitários, o cálculo do adicional de periculosidade deverá ser efetuado sobre a totalidade das parcelas de natureza salarial." (grifo Nosso).
No mesmo sentido, versa a Súmula 279 do TST:
"Adicional de periculosidade. Eletricitários. Base de cálculo. Lei nº 7369/1985, art. 1º. Interpretação. O adicional de periculosidade dos eletricitários deverá ser calculado sobre o conjunto de parcelas de natureza salarial."
Ademais, não somente a classe dos eletricitários sofrerá com a revogação da referida lei, os empregados militantes no setor de telecomunicações também serão prejudicados, vista que o TST equiparou aos eletricitário algumas funções deste setor. Percebe-se com a OJ Nº 347 da SDI-1:
347. “ADICIONAL DE PERICULOSIDADE. SISTEMA ELÉTRICO DE POTÊNCIA. LEI Nº 7.369, DE 20.09.1985, REGULAMENTADA PELO DECRETO Nº 93.412, DE 14.10.1986. EXTENSÃO DO DIREITO AOS CABISTAS, INSTALADORES E REPARADORES DE LINHAS E APARELHOS EM EMPRESA DE TELEFONIA (DJ 25.04.2007)
É devido o adicional de periculosidade aos empregados cabistas, instaladores e reparadores de linhas e aparelhos de empresas de telefonia, desde que, no exercício de suas funções, fiquem expostos a condições de risco equivalente ao do trabalho exercido em contato com sistema elétrico de potência”. (Grifo Nosso).
Em uma claridade diurna percebe-se a inconstitucionalidade desta lei, por constituir um sério retrocesso para os eletricitários e um estímulo à diminuição de investimentos no tocante a segurança do trabalho por parte dos empregadores. Somente quem milita no âmbito desta perigosa profissão, seja como profissional insertos neste setor, ou como Advogado calejado em litígios contra empresas deste ramo, para entender o risco da profissão e o elevado índice de morte por acidentes de trabalho destes profissionais.
Vislumbramos a revogação desta lei como um incentivo às empresas em deixar de investir em prevenção de acidentes, a lei traz um ar de inobservância a princípios fundamentais como o da dignidade da pessoa humana e principio da proteção prevista no direito do trabalho. Ademais viola diretamente a Constituição, sobretudo o artigo 7º:
“são direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social (...) “.
O dispositivo constitucional determina a garantia de normas infraconstitucionais que visem “a melhoria de sua condição social”, jamais normas que promovam a redução ou extinção de direitos sociais já criados e habitualmente aplicados, como no caso em epígrafe, que já goza a classe dos eletricitários do adicional de periculosidade diferenciado, desde o ano de 1985.
Advogamos pela inconstitucionalidade da referida lei, por afrontar direitos constitucionais, gerando um notório retrocesso/involução à classe dos trabalhadores do setor elétrico.
Enxergamos como afronta ao principio do “Não Retrocesso Social”, as sábias palavras genéricas do nobre Jurista J.J Canotilho retratam de forma inquestionável a restrição de direitos sociais experimentado pela classe dos eletricitários:
“O princípio da democracia econômica e social aponta para a proibição de retrocesso social. A ideia expressa também tem sido designada como proibição de “contra-revolução social” ou da “evolução reacionária”. Com isto que dizer-se que os direitos sociais e econômicos (ex.: direito dos trabalhadores, direito à assistência, direito à educação), uma vez alcançados ou conquistados, passam a constituir, simultaneamente, uma garantia institucional e um direito subjetivo. Desta forma, e independentemente do problema “fático” da irreversibilidade das conquistas sociais (existem crises, situações econômicas difíceis, recessões econômicas), o princípio da análise justifica, pelo menos, a subtração à livre e oportunista disposição do legislador, da diminuição de direitos adquiridos (ex.: segurança social, subsídio de desemprego, prestações de saúde), em clara violação do princípio da proteção da confiança e da segurança dos cidadãos no âmbito econômico, social e cultural (...). O reconhecimento desta proteção de “direitos prestacionais de propriedade”, subjetivamente adquiridos, constitui um limite jurídico do legislador e, ao mesmo tempo, uma obrigação de persecução de uma política congruente com os direitos concretos e expectativas subjetivamente alicerçadas. Esta proibição justificará a sanção de inconstitucionalidade relativamente a normas manifestamente aniquiladoras da chamada “justiça social” (assim, por ex., será inconstitucional uma lei que reduza o âmbito dos cidadãos com direito a subsídio de desemprego e pretenda alargar o tempo de trabalho necessário para a aquisição do direito à reforma) (...). De qualquer forma, mesmo que se afirme sem reservas a liberdade de conformação do legislador nas leis sociais, as eventuais modificações destas leis devem observar inquebrantavelmente os princípios do Estado de direito vinculativos da atividade legislativa.” (Direito Constitucional, Coimbra: Almedina, 1993, 6ª edição revisada, pp. 468/469).
Geralmente, os operadores do direito, principalmente aqueles que advogam pela classe dos empregados, diante da edição de uma nova lei no âmbito trabalhista é gerada uma expectativa de melhorias à classe, infelizmente, extraordinariamente, estamos diante de uma Lei que somente somou prejuízos aos eletricitários, constituindo um sério retrocesso.
Esperamos que os Tribunais entendam pela inconstitucionalidade do referido dispositivo, que as centrais Sindicais não se posicionem inertes e passivas, que ajuízem ADIN visando a declaração da inconstitucionalidade desta lei, fazendo valer as conquistas alcançadas ao longo das décadas.
Em um país capitalista, enquanto o trabalhador labora exclusivamente para viver, garantir o sustento de sua família, se manter, em regra, de forma precária, o empregador, geralmente grandes empresas, permanece na exploração da atividade econômica com o único objetivo de crescer, conquistar novos horizontes, comprar mais empresas, transformar-se em multinacionais e ganhar mais alguns milhões. Esse é o cenário nacional.
Alexandre Vieira de Castro
Advogado Trabalhista
Guanambi/Ba OAB/BA 37.400
Pós Graduando em Direito do trabalho e Direito Processual do Trabalho.
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