14/09/2015. Enviado por Dra. Monica Oliveira Balbino da Costa em Família
A União Poliafetiva é reconhecida pelo Direito Brasileiro? Quais direitos seriam garantidos pelo Estado aos conviventes da união poliafetiva?
Sobre as Famílias
A família é uma instituição fundamental na vida do indivíduo, sendo seu referencial de existência no mundo.
No Brasil, de início, era adotado o sistema patriarcal, onde a família era organizada sob a autoridade do homem. A mulher era subordinada ao marido, não tinha vontade prória; e os filhos deviam obediência ao pai, não cabendo aos mesmos qualquer tipo de escolha, inclusive no campo profissional.
Entretanto, o sistema patriarcal foi paulatinamente superado, já que as mulheres começaram a contribuir para a economia doméstica, deixando a condição de objeto e passando a sujeitos de direitos.
Com o tempo, foram surgindo relações entre o homem e a mulher constituídas sem o casamento, as quais eram mal vistas, principalmente pela Igreja. Assim, a Constituição Federal de 1988 quis retirar todo esse juízo negativo dessa relação e a classificou como "união estável", trazendo para esta a proteção do Estado, reconhecendo expressamente a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar・
Com o Código Civil de 2002, foi inserido o regramento da união estáel através do artigo 1.723. Como características da união estável, podemos destacar a diversidade de sexos; a convivência pública entre os companheiros de maneira notória e que a relação seja contínua e duradoura, apenas de não existir tempo mínimo para sua classificação.
A Uniã Estável Poliafetiva na realidade
Em 2012, foi exibida uma novela em horário nobre onde um personagem mantinha união simultânea com três mulheres. No entanto, não foi somente na ficção que surgiu a união entre mais de duas pessoas. Foi noticiado a pouco tempo que um homem e duas mulheres, residentes no Rio de Janeiro, após percorrerem vários Cartórios, conseguiram oficializar a união na cidade paulista de Tupã.
A união foi oficializada por meio de escritura púlica de União Poliafetiva. O termo empregado é um termo não oficial no mundo jurídico. A tabeliã explicou que o documento "é uma escritura pública declaratória de União Poliafetiva, onde os envolvidos deixam claras suas vontades e intenções como família".
Alguns juristas defendem que a união poliafetiva é perfeitamente aceitável, vez que nenhuma legislação proíbe. Para estes, a união poliafetiva é reconhecida como entidade familiar e merecem proteção do Estado, e por assim ser, o Estado Democrático de Direito não pode interferir na vontade dos membros de uma entidade familiar.
Os que se colocam favoráveis a este raciocínio defendem que o contrato de união poliafetiva é válido e produz efeitos, sendo que os envolvidos têm segurança em uma possível partilha de bens, podendo pleitear benefícios junto ao INSS, entre outros direitos concedidos a casais.
Para aqueles que não concebem a união estável poliafetiva como entidade familiar, a alegação é de que a famílias só pode ser constituídas por duas pessoas. Outrossim, no Brasil sempre vigorou a monogamia, sendo a bigamia proibida e ainda constitui crime.
Ainda, que o Código Civil de 2002, ao regular a União Estável, não mencionou qualquer possibilidade de vínculos de convivência múltipla. Assim, uma escritura pública de União Poliafetiva é absolutamente nula, pois não obedece as regras fixadas pelo legislador para validade do negócio jurídico. Igualmente, a lei somente fala em contrato de união estável e não em contrato de união poliafetiva. A escritura não é lícita porque não há previsão desta forma de contrato. Os argumentos também estão na esfera do dever de fidelidade, fixado pelo Código Civil, o qual deve existir para que se consuma uma união estável.
A união plurima, frente às entidades públicas, gera insegurança jurídica por envolver terceiros. Uma escritura pública deste caso altera o que é posto pela lei como família, já que esta é constituída pela união de duas pessoas somente, assim excluindo a união estável poliafetiva com a consequência de não se ter a proteção que é dada à família.
Se o caso for de União Estável Poliafetiva
O Estado não limita relacionamentos afetivos de ninguém, desde que estes não ultrapassem a intimidade das pessoas. No entanto, a união poliafetiva pode ser reconhecida como sociedade de fato, se assemelhando ao concubinato.
Aquele que se identifica em uma relação afetiva com mais de duas pessoas deve estar ciente que esta não será amparada como entidade familiar, e que a mesma fere balizas dispostas em nosso ordenamento. Sendo que os direitos desta relação serão mais difíceis de serem alcançados e provados, tendo que se recorrer a esfera cível para tanto.
A União Estável Poliafetiva para as jurisprudências
Não há ainda, nenhuma lei que autorize a união poliafetiva, e quanto às jurisprudências estas se mostram contrárias a este tipo de união, senão vejamos:
SÚMULA 122, DO T.J.R.J. UNIÕES ESTÁVEIS CONCOMITANTES: NÃO RECONHECIMENTO. Uniformização de Jurisprudência. Proposição de Sumula de Jurisprudência Predominante no Tribunal. Enunciado encaminhado pelo CEDES. Matéria de Direito de família. Reconhecimento de uniões estáveis concomitantes.Inadmissibilidade. Enunciado 14- “É inadmissível o reconhecimento dúplice de uniões estáveis concomitantes.” Justificativa: A Constituição Federal reconheceu a união estável como entidade familiar (art.226, par.3.). A moral da família é uma só. A duplicidade de casamentos implica na figura típica da bigamia, logo não pode ser admitida a “bigamia” na união estável. Enunciado aprovado com a seguinte ementa de redação: “14- É inadmissível o reconhecimento de uniões estáveis concomitantes.
EMENTA CIVIL: Ações de reconhecimento de uniões estáveis post mortem. Reconhecimento de duas uniões estáveis havidas no mesmo período.Possibilidade. Excepcionalidade. Recursos Desprovidos. I– Os elementos caracterizadores da União estável devem ser tomados de forma rígida, porque as relações sociais e pessoais são altamente dinâmicas no tempo. II- Regra geral, não se admite o reconhecimento de duas uniões estáveis concomitantes, sendo a segunda relação, constituída á margem de primeira, tida como concubinato, ou nas palavras de alguns doutrinadores, “união estável adulterina”, rechaçada pelo ordenamento jurídico. Todavia, as nuances e peculiaridades de cada caso concreto devem ser analisadas para uma melhor adequação das normas jurídicas regentes da matéria, tendo sempre como objetivo precípuo a realização da Justiça e Proteção da entidade familiar- Desiderato último do direito de Família. III - Comprovado ter o de cujus mantido duas famílias, apresentando as respectivas companheiras como suas esposas, tendo ambas filhos e patrimônio constituído, tudo a indicar a intenção de constituição de família, sem que uma soubesse da outra, impõe-se, EXCEPCIONALMENTE, o reconhecimento de ambos os relacionamentos como uniões estáveis, a fim de se preservar os direitos delas advindos. (grifos nossos)
EMENTA: Relacionamentos Concomitantes. Impossibilidade de caracterização de União Estável. 1. A manutenção de relacionamentos concomitantes impede seu reconhecimento como entidade familiar ante a ausência do affectio maritalis 2. Recurso conhecido e improvido. Unanimidade.
EMENTA: Família. União Estável. Caracterização. A união estável se caracteriza pela convivência duradoura, pública e contínua, de um homem e uma mulher, estabelecida com o objetivo de constituição de família. O reconhecimento de união estável em relação a uma mulher impede o reconhecimento de tal relação em face de outra com quem, a despeito da existência de relacionamento amoroso, não se caracterizou a constituição de entidade familiar, por exclusão lógica.
EMENTA: AGRAVO REGIMENTAL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. CIVIL. DIREITO DE FAMILIA. UNIÕES ESTÁVEIS SIMULTÂNEAS. REQUISITOS LEGAIS. EQUIPARAÇÃO AO CASAMENTO. PRIMAZIA DA MONOGAMIA. RELAÇÕES AFETIVAS DIVERSAS. QUALIFICAÇÃO MÁXIMA DE CONCUBINATO. RECURSO DESPROVIDO.[...] 4. Este Tribunal Superior consagrou o entendimento de ser inadmissível o reconhecimento de uniões estáveis paralelas. Assim, se uma relação afetiva de convivência for caracterizada união estável, as outras concomitantes, quando muito, poderão ser enquadradas como concubinato ( ou sociedade de fato) [...].
Referências
[4] PEREIRA, 2010, p. 29.
[5] Referência à Igreja Católica.
[6] GONÇALVES, 2010, p. 28.
[9] Parágrafo 4º, artigo 226 da Constituição Federal de 1988: “Entende-se, também, como entidade familiar a comunidade formada por qualquer dos pais e seus descendentes.”
[13] VENOSA, 2011, p. 37.
[14] Artigo 226 da Constituição cf nota nº 05:
[16] Artigo 1723 do Código Civil de 2002: “É reconhecida como entidade familiar a união estável entre o homem e a mulher, configurada na convivência pública e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição de família”.
[17] GONÇALVES, 2010, p. 587.
[20] GONÇALVES, 2010, p. 598.
[21] Artigo 1727 do Código Civil de 2002: “As relações não eventuais entre o homem e a mulher, impedidos de casar, constituem concubinato”.
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